quinta-feira, 20 de março de 2008

ladrões e polícias, a propósito da onda de assaltos na zona de Sintra

Ontem, uma miúda de uns 18 anos serviu-me um pastel de bacalhau e outro de nata num café de S. Marcos. Olhou para mim e disse "se entrassem por aqui adentro esses gatunos até lhes levava a caixa registadora à porta, só para não me chatearem. Já disse isto à minha avó." Mirei os meus lados e estava ninguém. Por que raio de razão se me dirigiu ela, naqueles termos?
Lembrei-me então de outra história, passada aqui há uns 21 a 22 anos.
Por via das minhas andanças políticas, cabia-me então frequentar bairros duvidosos, para fazer reuniões de "agit-prop" e para angariações de fundos, sobretudo no Casal Ventoso, então o entreposto mais poderoso das pequenas e médias máfias ligadas ao tráfico de droga e à ladroagem de pequena e meia-tigela.
Os meus passos já eram o que são, pesados e tonitruantes. As minhas roupas eram quase sempre o preto e o cinzento, apenas intervalados pela ganga, ás vezes preta também. Mas havia em mim algo mais, um certo ar grave, uma qualquer coisa que fazia despertar campainhas nos sistemas de avisos em série que as máfias tinham montado.
E o que sucedia então, nos meus tempos iniciais de incursão no Casal Ventoso? Assim que eu chegava, por uma das 3 entradas que o Casal tinha, os traficantes desapareciam dentro das casas, avançando para as janelas mulheres, que verdadeiramente monitorizavam os meus passos.
Disseram-me mais tarde que durante o meu primeiro mês de idas ao Casal Ventoso tinha estado várias vezes em risco de ser esfaqueado, ou no mínimo sovado.
Um dia os meus camaradas encarregaram-se de fazer chegar às máfias a informação de que aquele gajo era apenas um pacato puto de pouco mais de 20 anos, que por acaso parecia um polícia. Livrei-me de boa.
Durante os vários anos - até 1993 - em que frequentei bairros do género, o "2 de Maio", à Ajuda, o "Bela Flor", o bairro da "liberdade", tantos outros, várias vezes me diziam que deveria sorrir quando passasse nas ruas, e usar roupas mais alegres, e aligeirar o passo. Algumas vezes me tentaram provocar, intimidar, quase bater. Sempre conseguiu a minha retórica safar as situações.
Já quanto a S. Marcos hei-de voltar mais vezes. Na próxima, talvez a jovem me peça que prenda alguém, o namorado, um cliente contumaz, alguém que tenha simplesmente ar de gatuno.

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